terça-feira, 5 de junho de 2007

Estados africanos

A destribalização é uma das consequências da colonização, a imposição externa de ocupar territórios com carácter permanente, levou a que grupos que antes dirimiam os seus conflitos de forma tradicional, com outras formas de luta, por exemplo cedendo um dos seus membros como compensação pela morte causada num grupo rival, associado a ritos e à sua capacidade de libertar factores de tensão, passaram a adoptar uma postura de guerra violentíssima, de que é o exemplo mais conhecido, o que sucedeu no Ruanda em 1996. O chefe Africano típico estudou na Europa e está envolto em misticismo, tal sucedeu com Nino Vieira e voltou a acontecer com Kumba. O exemplo fornecido para se tentar perceber as especificidades dos estados africanos post colonizados, vai ser dado através das já recuadas eleições para presidente da Guiné Bissau. É uma sociedade que valoriza a arma e o militar, é uma sociedade espartana que acolheria de braços abertos quem se dispusesse a desempenhar o papel de herói, foi o que Kumba fez, homem viajado e estudado, tornou-se um mestre na arte da cena e da encenação, através da qual convenceu a sua etnia Balanto e muitos fora dela a apoiá-lo. Estamos perante Estados com características e formas de racionalizar distintas da Ocidental e vamos ver como a dádiva, o favorecimento (nepotismo), o mercado paralelo, o religioso, entre outros aspectos, estão presentes na eleição de um chefe de estado Africano: a cultura Africana sente o dom como estrutura elementar da sua organização social, assim uma eleição é um excelente momento para que autênticas mercearias ambulantes percorram o país distribuindo T-shirts, arroz, açúcar, bicicletas, dinheiro, chapas de zinco,blocos de cimento, etc. Neste tipo de socializações favorece-se o candidato mais generoso e não propostas e medidas políticas. Na Guiné, aliás como em muitas outras partes do mundo, há que distinguir os centros urbanos dos meios rurais, os primeiros mais escolarizados e por isso com maior acesso aos meios de comunicação social, enquanto que os segundos inseridos num meio tradicional, privilegiam um tipo de voto com tendência comunitária, isto é, aquele que decorre da decisão das autoridades locais. Estamos perante um exemplo, de como em África subsistem poderes paralelos, como resultado da aplicação “leofilizada” de um modelo que historicamente lhes é estranho e resultante de uma política ocidental destinada a munir-se dos meios para à distância exercer o controle das operações, ainda que tal não produza o efeito pretendido, um pouco à imagem do pai que se quer amar a si próprio, no bastardo. A coexistência de uma forma de poder tradicional e comunitário, com um poder de estado, faz-me igualmente lembrar as Ujamaa do presidente da Tanzânia Julius Niereri, com as consequências incongruentes com os propósitos que se conhecem. No meio rural são os chefes tradicionais, religiosos e os anciãos quem na realidade detém o poder, determinando o voto étnico ou de forma mais pragmática o apoio ao candidato mais generoso, ou seja que mais os favorece. O voto é encarado como uma mercadoria ou como um meio para colocar no poder um da sua etnia e religião.
De todos estes temas muito complexos e desta multiplicidade de coisas sociais em movimento, não queremos aqui considerar senão um dos aspectos: o carácter voluntário, por assim dizer, aparentemente livre e gratuito, e todavia forçado e interessado, dessas prestaçoes (Mauss in casal 2005:134)
Casal, Yánez 2005 Entre a Dádiva e a Mercadoria, Edição do autor: Amadora.

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