sexta-feira, 2 de março de 2007

Estudo de caso sobre a comunidade travesti brasileira em Portugal

É um fenómeno que se insere na globalização, nomeadamente no aspecto de uma maior porosidade das fronteiras e de um aumento de fluxos de pessoas, ideias, imagens, etc (Giddens). É uma investigação que levanta igualmente outras questões, a imigração ilegal, a não coincidência de género e de sexo ou seja temáticas relacionadas com a liminaridade sexual, por outro lado a religiosidade, que se revela igualmente interessante, visto que grande parte delas provêm de famílias evangélicas, sendo que neste meio as práticas relacionadas com o Candumblé e Umbanda são uma constante.
É um fenómeno essencialmente urbano, ligado à prostituição que encontra nas maiores cidades portuguesas o seu locus preferencial.
Vou aqui contar alguns episódios que possam elucidar e de alguma forma retratar como é fazer um trabalho destes e as situações com que nos deparamos. Lógico que a intenção aqui não é expôr conclusões, não seria o local certo para o efeito.
Certo dia, estava eu em casa a trabalhar , um pouco antes do natal de 2006, quando recebo uma chamada telefónica....era Adriana em pânico, para ser sincero ao princípio nem percebi bem o que se passava, tal era o atropelo das palavras debitadas em catadupa. Um cliente havia falecido após o acto sexual, ou seja havia caido redondo no chão e Adriana pedia o meu auxílio, visto que era português, para falar com a polícia.
Levantam-se aqui algumas questões: a questão da clandestinidade que faz com que se evitem os contactos com a polícia e da minha parte, a resposta a dar que podia afectar o futuro do meu trabalho. No entanto e apesar de algum remorso, a minha resposta foi não, que não o podia fazer. A resposta de Adriana não podia ser mais digna, ela que com facilidade poderia ter dito que não podia contar mais com ela para a realização do trabalho, acabou, mais tarde por me dizer...que tinha que entender a posição das pessoas. Será pois a dignidade e o sentido de justiça apenas característico dos grupos dominantes??.
Tirem as vossas conclusões.

1 comentário:

sapiens disse...

Ora aqui está um belo exemplo da imprevisibilidade do trabalho de investigação antropológico. voltando ao classico Malinowski, temos de aprender a lidar com os imponderaveis da vida real dos nossos objectos e universos de estudo.

Quanto á questão da justiça, não penso que possamos falar de justiça, mas sim de capacidade de compreender o lugar do outro. Tal como nós antropologos devemos de compreender o lugar do outro sem julgamentos, também os nossos informantes parecem compreender o nosso lugar. As relações establecidas devem basear-se na compreensão, na não condenação (e no conforto que esta dá especialmente a grupos de margem)
uma vez que o antropologo nunca está (nem pode estar) totalmente dentro do grupo que estuda... os nossos informantes sabem disso, e atribuem-nos um lugar de excepção que pode culminar numa tolerancia que provavelmente
nao teriam para com os seus iguais.