domingo, 25 de fevereiro de 2007

Antropólogos nesta Sociedade: Futuro ou Abismo?

Ao ler a pequena discussão no post "Antropólogo VS. Político", pareceu-me de todo coerente traçar uma linha cognitiva sobre a posição dessa figura - o antropólogo - que cada vez mais não passa de um mito do século passado.
É inegavel a existencia de evoluções tanto no aspecto micro como no aspecto macro de uma sociedade qualquer, idependentemente do contexto económico, politico e religioso em que se insere. E que essas "evoluções" (prefiro utilizar o termo "mudanças" ou "alterações" devido ao uso nefasto que tenta dar um valor simbólico sempre positivo ao termo "evolução") resulta de confrontos constantes entre delirios pessoais com delirios colectivos. Ultimamente a visão de um antropólogo provoca uma série de reacções. Para o comum dos mortais, o antropólogo é um ser abstracto que serve "só" para estudar os primitivos, as "sociedades frias" de história repetitiva (cf. Lévi-Strauss), as tribos, etc. Ou seja, somos diariamente confrontados com frases como "Antropólogos? Ah...aqueles tipos que estudam as tribos em Africa...". Não que se afaste muito da realidade, ou pelo menos do passado do antropólogo, que foi muitas vezes confudido como agente do governo colonial, ora através de uma relação cognitiva de construção preconceituosa ora de forma conciente e complacente pelo próprio antropólogo. Mas as alterações ao longo do tempo desde do inicio do século XX provaram que o mapa de objectos de estudos era bem mais alargado que o que era oferecido pela situação colonial que entrava em declínio. Não só pelos acontecimentos históricos bem conhecidos, mas também pela crescente saturação de estudos de casos e etnogtrafias coloniais africanas e arredores do mundo industrializado dito civilizado por oposição.
Mas o que nos interessa (e peturba) é o real da situação presente. Podemos olhar de forma pouco interessada e relativista de que ainda existe muito campo para o antropólogo investigar e trabalhar. Claro que por conta própria, mas, nesse aspecto está em todo o cidadão com o mínimo de curiosidade e de capacidade económica (mesmo não tendo a formação académica para tal) partir em busca do seu objecto e desenvolver através da sua própria observação o resultado. Mas em termos profissionais, ou seja, como emprego em que desenvovle estudos a troco da contrapartida monetária (de acordo com a legislação em vigor referente ordenados minimos da dita Sociedade) é totalmente inexistente. Não só porque, por um lado os antropólogos são vistos. cada vez mais, como empecilhos ao poder politico local e poder central, bem como por outro lado levanta um certo número de questões éticas e morais. Este último aspecto é "uma espada de dois gumes": ora por permitir levantar a suspeita sobre todo trabalho efectuado de toda uma classe em que por motivos religiosos, culturais, étnicos ou políticos leva um antropólogo a apresentar um estudo de caso ou levantar outras questões, ora por que a utopia é uma abrastracção delirante e que é bem possivel a existencia de certos individuos que traiem a sua prespectiva científica a troco de algo mais (um cargo politico ou um lugar de relevancia no partido X, posiçao na empresa Y, dinheiros e outros prémios, etc.) e a corrupção pode tomar várias formas. É este confronto (a imagem actual do antropólogo perante o "poder" e a relação entre este "poder" e o antropólogo) que tem levado cada vez mais para o esquecimento a Antropologia.
Na minha opinião, perante a minha formação e capacidade de observação que a Antropologia encaminha-se para um caminho sem retorno, sem futuro para os formados. Um futuro que se encerra em visitas curtas e esporádicas ao campo de trabalho e cada vez mais fechado entre quatro paredes a ler clássicos de outros tempos. O caminho para a recuperação, a meu ver, começa tanto dentro da Antropologia bem como pelos próprios poderes instalados que adoram a estagnação.

3 comentários:

Pitts para venda disse...

Concordo contigo, as perspectivas não são as melhores, até porque a antropologia não produz dinheiro...quanto muito desconstroi ideias caras e necessárias à sobrevivência e pertpetuação da civilização ocidental moderna, pelo que cabe-nos a nós e visto que os apoios parecem ser inexistentes...abrir o caminho e acreditar no nosso trabalho...não necessariamente contra nada, mas colocando questões...levantando problemas àcerca de ideias e conceitos tidos como adquiridos, nesta nossa civilização,nos quais ela repousa alegremente em carnavais de campanhas eleitorais ou então em rituais de inversão (o carnaval tradicional), onde nem sequer têm a consciência que participam (em que os políticos aparecem como cabeçudos no seu próprio interesse) e lhes é permitido descomprimir durante três dias(neste caso), reforçando a ordem social instituida durante 362 dias, mediante uma descompressão ritual, onde simbolicamente se invertem as relações de poder instituídas. Este é um exemplo de como a antropologia e os seus agentes, não produzem dinheiro...apenas criam dificuldades ao pleno exercício da demagogia...num plano social e político, em que quem a exerce muitas das vezes nem tem a consciência de que o faz. Então sejamos incómodos...qualquer opinião é política...pode é não se encontrar aprisionada nos jogos de poder dos aparelhos partidários.

sapiens disse...

A antropologia apenas produz dinheiro quando com a ajuda desta se conseguem desobstruir certas barreiras, ou erguer outras que sejam lucrativas para os detentores do capital... de qualquer das formas não me parece que a esmagadora maioria destes detentores considere actualmente a contratação de antropólogos para justificar o que quer que seja pois o dinheiro só por si ganhou estatuto de legitimador na sociedade capitalista e democrata.


Infelizmente não creio que seja apenas a área da antropologia a unica na qual muito poucos estão dispostos a investir... trata-se de um mal que afecta todo o património cultural. A nova ordem mundial impõe ao cidadão comum os novos padrões culturais assentes na publicidade, na moda e no consumo (estes sim geram DINHEIRO, IMPOSTO, LUCRO).


Note-se claro, que devemos de excluir deste património cultural produções e eventos como a musica difundida em canais como a MTV, essa sim, cheia de patrocinios. Seguindo uma lógica análoga vemos que se no passado a antropologia foi lucrativa (e patrocinada), foi precisamente pro ser através dela possivel gerar dinheiro.

Trata-se de um raciocinio até certo ponto simples...para quê investir em algo que não produz beneficio. entramos assim no cerne da questão: O que é que em pleno século XXI é beneficio?

poem-se aqui os binómios.


DINHEIRO --- CONHECIMENTO


Conhecimento que gera dinheiro --- VS --- conhecimento que não gera dinheiro

Actualmente quer-me parecer que a humanidade se encontra numa encruzilhada inédita.
podemos seguir o caminho do conhecimento que Gera dinheiro e continuar a desenvolver-nos tecnológica, economica e demograficamente, ou seguir o caminho do conhecimento que não gera dinheiro para garantir a manutençao das sociedades e das civilizações de forma sustentada como vemos por exemplo através de muitas medidas ecológicas, que mesmo contra-producentes em termos monetários começam a ser implementadas por motivos de sobrevivencia da própria humanidade já não a longo, mas a médio prazo.

A par desta manutenção saudavel das sociedades humanas devemos de ter (para a sustentar) o desenvolvimento cultural e educativo das populações que não seja apenas pautado por matemáticas e tecnologia, (como a actual conjuntura nos quer fazer crer) mas também por outras actividades muito negligenciadas pelos estados neo-liberais tais como a musica, as artes plasticas ou as humanidades (que promovem o desenvolvimento cognitivo e a auto-satisfação dos seres culturais) e que na actual conjuntura é compensado pela neofilia de um consumo desenfreado prejudicial a todos os niveis (menos para os senhores do grande plano da nova ordem mundial).

Ego disse...

Apanhei este blog por mero acaso navegando na net. Acho q encontrei um espaço bastante interessante de reflexão sobre os caminhos e descaminhos da antropologia actual. A questão central abordada neste artigo parece-me ser de uma importância vital - a identidade do antropólogo e o futuro da disciplina. Também sou antropólogo, licenciado pela Nova em 1991 e com pós-graduação em Paris, etc., e bastante sensível à questão. Concordo em absoluto com a tese q configura o antropólogo como uma figura do século XX. Evidentemente, a disciplina tem raízes muito mais fundas, e o perfil do estudioso q caracteriza o antropólogo já existia de algum modo mto antes. Mas é de facto o colonialismo q traz o antropólogo para a ribalta. O contexto colonial, como diz o autor deste artigo, foi uma faca de dois gumes, ou um presente envenenado, pois embora tenha possibilitado a consagração da disciplina e dos seus métodos, envolveu-a para sempre numa ambiguidade q se revelou poder ser fatal.
Essa figura do século XX é hoje um moribundo, e já não há retorno.
Mas parece-me q a antropologia não pode desaparecer. Desde logo pq, tal como afirma o comentador "Sapiens", faz parte do "património" civilizacional do Ocidente. Isto dava pano para mangas. Quero apenas ressaltar q esta justa ligação da antropologia ao edifício do conhecimento q é património do Ocidente, e q permitiu dar voz e dignidade a muitos povos dominados, nao pode ser escamoteada.
Por outro lado, pq a antropologia foi a única disciplina q levou longe o paradigma da "das verstehen", ou seja, da compreensão, bastante diferente da simples descrição ou da explicação, dominantes na maioria das ciências. Compreender o significado da acção do outro, do alterego, é tentar ver o sujeito. E na nossa época, a da modernidade radicalizada, já não há outro caminho senão o do sujeito, tal como bem o explicam Anthony Giddens (o projecto do self reflexivo) ou Alain Touraine (projecto do sujeito.
Isto para dizer q um dos erros q tem prejudicado a disciplina é a de a aprisionar à ideia q só estuda grupos sociais. O facto de ser uma ciência social nunca a impediu de mergulhar no sujeito, e para verificar isso basta ir até à estante e de lá tirar o livro do Oscar Lewis "Os filhos de Sanchez".
Outro erro enorme, conexo da perversa ligação da antropologia às minorias (em consequência do "virar-se para dentro" depois do fim do colonialismo), é a ingénua concepçao q tende a fazer da antropologia uma espécie de disciplina anti-poder. Parece-me q esta postura ainda torna mais ambígua a já frágil posição da disciplina e da profissão no nosso contexto.
A minha conclusão é q a utilidade da antropologia reside sobretudo, nos nossos dias, nessa possibilidade aberta pela emergência do sujeito e os estilos de vida q determinou. O sujeito é hoje a figura central da modernidade, e a política passa cada vez mais pela vida pivada. Há, portanto, q trabalhar nas experiências e nas identidades, etnografá-la e compreendê-la. Pq já não ha um sistema social, há vários. E já ninguém se orienta por uma única lógica, mas por várias. Que cultura se está a formar? Como é q a tradição se entrosa nesta compulsão transformadora? Etc.
São questões a q o antropólogo, em minha opinião, não se pode eximir. É necessário sair do colonial e do anti-poder e avançar no mercado munido não só do capital de conhecimentos adquiridos, mas de uma perspectiva realista, ou seja, com a mão no pulso da realidade.
De facto, não somos afastados só por sermos incómodos, mas pq muitas vezes a nossa utilidade não aparece evidente. E isso é culpa nossa.
Bem hajam e obrigado